domingo, 10 de maio de 2009

Nosso Desempenho no ENEM

Uma abordagem temática de um assunto que está dando o que falar entre alunos e professores de nível médio.

O texto abaixo é o editorial do JC publicado no dia 04.05.2009

“O sentimento mais imediato – e superficial – da leitura do Enem, que o MEC acaba de divulgar, é o de aprofundamento das distâncias entre Norte/Nordeste e Sudeste, entre escolas públicas e escolas privadas. Nos números aferidos pela avaliação de 26 mil escolas, os melhores resultados estão nos Estados com mais qualidade de vida, mais renda e melhores índices de desenvolvimento humano. Das 20 escolas com maior pontuação no Exame Nacional do Ensino Médio apenas duas são do Nordeste – uma do Recife, outra de Teresina - e nenhuma do Norte do País. O predomínio absoluto é de escolas do Rio de Janeiro, Belo Horizonte e São Paulo. Quinze dessas escolas são particulares.image

Os resultados do Enem podem, assim, nos levar a uma leitura simples que reproduz clichês e cenários históricos reais, mas será uma leitura que não trará clareza sobre um tema que exige muito mais que discursos repetitivos sobre o papel da educação. Ler com mais profundidade nos levará a compreender por que o Ministério da Educação lança – ao mesmo tempo em que divulga a avaliação do Enem – a Conferência Nacional de Educação, que será realizada em abril de 2010 para tirar um plano de ação e metas a vigorar a partir de 2011. Significa dizer que o exame que se presta hoje a tantas expectativas, inclusive da conquista de um lugar no ensino superior, é um detalhe que alerta para as desigualdades, pode contribuir com políticas públicas, mas está longe de apontar para o grande desafio da educação brasileira.

No plano prático e imediato, uma das lições desse exame está na constatação do ministro da Educação, Fernando Haddad, de que o baixo desempenho dos alunos de escolas da rede pública estadual pode ser atribuído à insuficiência de investimentos. Ele disse que a média de investimento nos Estados é de R$ 1,5 mil por aluno/ano, valor comparável ao de uma mensalidade da rede privada. Outra lição do ministro nos diz que "não é possível aferir melhorias com o atual modelo" do Enem. A ideia de um novo Enem, contudo, não esgota a necessidade sempre presente de renovar o discurso em torno de educação e desenvolvimento, com o cuidado de não pensar educação como mera qualificação para o mercado de trabalho. image

Daí a necessidade de uma leitura mais rigorosa do resultado do Enem e o cuidado para não torná-lo indicador matriz de cursinhos para conquistar melhor posição nos exames anuais como credenciamento para alargar ainda mais a distância do ensino privado do ensino público, o que pode reduzir a meta do exame à otimização do lucro. É evidente que há um caminho a ser percorrido na melhoria do ensino em todos os níveis e essa deve ser a expectativa da anunciada Conferência Nacional de Educação, que poderia despertar entre nós, nordestinos, alguma coisa como a atenção criadora de um Paulo Freire ou de tantos grandes educadores que fazem a história da pedagogia nacional, para impedir que saia daquela conferência apenas o clamor por mais verbas para Estados e municípios cuidarem da educação.

É preciso atentar para lições como a do professor Antonio Novoa, doutor em Educação e catedrático da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Lisboa. Referência obrigatória em qualquer estudo mais sério sobre educação também no Brasil, Novoa ensina que “as escolas valem o que vale a sociedade. Não podemos imaginar escolas extraordinárias, espantosas, onde tudo funciona bem, numa sociedade onde nada funciona”. Também é dele a advertência de que é um erro fundamental supor que as nações são grandes porque a sua escola é boa: “Certamente que não há grandes nações sem boas escolas, mas o mesmo deve se dizer da sua política, da sua economia, da sua justiça, da sua saúde e de mil coisas mais”. Lições como essas nos devem levar à reflexão sobre as reais necessidades da educação, bem mais que a corrida por uma melhor colocação no ranking do Enem.”

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